
Demorou, mas aconteceu: a educação hypou geral. O assunto aparentemente mais chato e subdiscutido do universo (até economia ficou popular ANTES de educação) finalmente ganhou espaço mainstream de debate. Pelo menos de onde posso observar, parece que a conversa atinge estratos diferentes da sociedade, desde grandes veículos (a Veja, a Época, a Globo, o grupo de comunicação sulista RBS com suas reportagens, bandeiras e bravatas) até o pessoal mais ligado e moderno (educação tem sido pauta de blogs de arte, design e cultura digital, documentários, palestras online, projetos no Catarse e por aí vai).
Eu não ia me meter nesse papo, mesmo sendo filho de professores e tendo acompanhado por décadas as questões que agora são debatidas (até porque minha principal preocupação sempre foi o impacto do salário do magistério na minha mesada – ou na inexistência dela). Mas, algumas semanas atrás, fui convidado por uma amiga a participar de um workshop no mestrado dela, dividindo uma mesa de brainstorm sobre o futuro da educação com dois designers, uma arquiteta, uma consultora de educação, uma profissional de TI e uma arte-educadora. Foi uma tarde de muito aprendizado pra mim e me trouxe questões bacanas. Então, agora eu entro na onda, num espírito mais informal, mais papo de boteco. Abaixo, listo e comento rapidamente alguns pontos que passaram pela mesa da qual participei.

* O pressuposto básico de toda reflexão mainstream em educação hoje passa primordialmente por três pontos: os baixos indicadores de desempenho da educação brasileira nos diferentes rankings mundiais ou domésticos; os problemas de recursos (investimentos, infra-estrutura de escolas e professores, que infelizmente são tratados como recursos) e as mudanças de relação com os conteúdos por conta da cultura digital.
* No entanto, pouco se fala a respeito de qual seria o papel da educação em um contexto que trata professores como recursos, alunos como força de trabalho para o mercado e infra-estrutura como moeda política.
* O desinteresse das novas gerações de alunos nos métodos mais comuns usados atualmente no ensino básico e fundamental são frequentemente atribuídos à competição com o universo da tecnologia, mas essa parece uma explicação superficial. A competição não seria entre o celular e o quadro negro, mas sim entre uma atividade que tem sentido na vida do aluno e outra que não tem.

* Desse ponto de vista, a resposta automática para isso é sempre, no caso dos jovens adultos, o “ensino técnico voltado para o mercado de trabalho”, como se o mercado de trabalho fosse ou tivesse que ser o objetivo central de vida de todo mundo (uma ideia impulsionada naturalmente pela situação econômica recente no Brasil). Não há duvida de que o encaminhamento profissional tem o papel importante de inserção social, mas a inserção não pode se resumir a isso pois nem sempre o trabalho dá conta de todas as necessidades de uma pessoa, especialmente as mais subjetivas, especialmente num contexto em que a imensa maioria das pessoas trabalha simplesmente para garantir o seu.
* Uma alternativa a isso seria uma educação orientada a objetivos de vida mais amplos. Por exemplo, a ideia tradicional de alguém que busca um curso de medicina é porque essa pessoa “quer ser médica”. A outra forma de pensar trocaria o “ser” pelo “fazer”: não quero “ser” médico, mas sim quero “tratar pessoas” ou quero “trabalhar no Médico Sem Fronteiras” ou quero “atender na clínica da família” ou quero “ajudar minha região”. A diferença soa sutil mas são abordagens de educação bem distintas que trariam conteúdos e especialidades também distintos. Claro que no ensino básico e fundamental essa abordagem é um pouco mais indireta, mas possivelmente aspirações como “quero ajudar os animais”, “quero ser super herói” ou “quero dar uma casa para minha mãe” poderiam ser utilizadas.

* Dentro dessa abordagem surgem outros formatos de ensino, alguns dos quais já vem sendo utilizados em muitas escolas. Um desses formatos é a cultura de projeto, na qual o aluno aprende conteúdos através de módulos de investigação, reunião de informações, consolidação e apresentação do consolidado.
* A cultura de projetos traz junto a necessidade de desenvolvimento de uma série de habilidades, algumas clássicas e outras nem tanto: buscar informações confiáveis; juntar e criar sentido a partir da junção de informações; fazer a gestão da atenção frente a tantas informações (especialmente na presença de múltiplas telas); o uso de linguagem audiovisual digital como legítima e constante em trabalhos de colégio; e, por fim, a ideia do professor como coach desse processo, como fonte de autoridade desse fazer e não dos saberes (o professor que sabe buscar informação, juntar e criar e não o que sabe responder).
* Última nota: a ocupação avançada de territórios por pequenos centros de pesquisa ligados a instituições de ensino. As bibliotecas e quadras de esportes de escolas públicas são em geral liberadas para uso da comunidade, mas isso pressupõe que as pessoas se dirijam à escola. Esse conceito é mais parecido com a inserção geográfica das lan-houses: pequenos pontos de convergência do público dotados de tecnologia pra busca e combinação de informação e, pelo tamanho reduzido, misturado às comunidades. Mais do que isso, um espaço de convivência lúdica, sem as formalidades e os muros das escolas mas ligadas a ela de alguma forma.
Ok, eu sei que muitos desses pontos são estudados por gente séria e já foram discutidos por aí. Mas eu não resisti a dar meus leigos pitacos entre uma cerveja e outra. Garçom, manda mais uma!!